Atualmente a Praça Onze é reconhecidamente um
local que remete aos afrodescendentes e sua cultura. Muitos creditam o feito à
inauguração do Monumento de Zumbi dos Palmares,1986. Muito antes porém, o berço
do samba já acalentara outro jovem negro, de 27 anos, herói que defendeu o
território brasileiro na Batalha do Riachuelo, um dos mais importantes episódios
da Guerra do Paraguai: Marcílio Dias.
Onde tudo começou ...
Até o final do século XVII a região onde se
situa a Praça Onze de Junho (Praça Onze) era desabitada. Após a chegada da Família
Real Portuguesa, por volta de 1810, cabe ao Rei D. João iniciar a ocupação do
que hoje conhecemos como Cidade Nova inaugurando o Largo do Rocio Pequeno.
Entretanto, a primeira benfeitoria no local só
ocorre em 1842, com a implantação de um chafariz em cantaria, de estilo neoclássico,
projeto de Grandjean de Montigny, para servir no abastecimento das casas e
estabelecimentos do entorno.
Anos mais tarde, com o início da Guerra do
Paraguai (1864/1870) e a onda de nacionalismo a partir da vitória brasileira
na Batalha Naval do Riachuelo (1865), o Imperador Pedro II rebatizou o
Largo do Rocio Pequeno com a data do confronto principal que levou à morte,
entre outros, o marinheiro Marcílio Dias: Praça Onze
de Junho.
O relatório oficial sobre a batalha aponta Marcilio Dias
como herói. Escrito pelo comandante do navio
Parnahyba, capitão-tenente Aurélio Garcindo Fernandes de Sá (1829-1873), o
relato destaca vários oficiais, sargentos, soldados e marinheiros que lutaram
com bravura. Mas o destaque maior foi reservado a Marcílio Dias, que morreu
enfrentando os inimigos na ponta da espada:
"O imperial marinheiro
de 1ª classe Marcilio Dias, que tanto se distinguira nos ataques de Paissandu,
imortalizou-se ainda nesse dia. Chefe do rodízio raiado, abandonou-o somente
quando fomos abordados para sustentar braço a braço a luta do sabre com quatro
paraguaios. Conseguiu matar dois, mas teve de sucumbir aos golpes dos outros
dois. Seu corpo, crivado de horríveis cutiladas, foi por nós piedosamente
recolhido, e só exalou o último suspiro ontem pelas 2 horas da tarde,
havendo-se-lhe prestado os socorros de que se tornara a praça mais distinta da
Parnahyba. Hoje, pelas 10 horas da manhã, foi sepultado com rigorosa
formalidade no rio Paraná, por não termos embarcação própria para conduzir seu
cadáver à terra".
A partir do retrato, o escultor Luis Paes Leme criou o monumento, doado pelo Clube Naval à cidade para colocação na Praça Onze, concretizando a homenagem com a inauguração em 11 de junho de 1948, aniversário da batalha e da morte de Marcílio Dias.
As razões que retiraram
o busto da Praça Onze
A primeira remoção do monumento ocorreu em 1978 para
as obras do Metro. A recolocação ocorreu no ano seguinte, 1979, até que em 1983,
um acidente de carro avariou o pedestal e derrubou o busto. Recolhido pela 6ª
Delegacia de Polícia, foi encaminhado ao Comando do 1° Distrito Naval, na Praça
Mauá, e posteriormente entregue para o antigo Departamento de Parques e
Jardins, onde os danos sofridos foram recuperados.
De volta à Praça Onze, foi reinstalado em
1986, meses antes da inauguração do Monumento à Zumbi dos Palmares, onde
permaneceu até ser roubado em 1988 conforme registram o ofício 520-0-DGPJ, de
19 de dezembro de 1988, e as notícias dos jornais da época.
Recuperado,
o busto foi reinaugurado na Praça Barão de Ladário,
em 1995, em frente ao I Distrito Naval, onde ficou até 2012. Sua remoção
deveu-se à execução das obras de infraestrutura do projeto Porto Maravilha.
Atualmente encontra-se sob a guarda da Marinha do Brasil, enquanto espera nova
oportunidade de voltar à área pública.
Biografia de Marcílio Dias
Marcilio Dias ingressou na Armada Imperial como recruta em 6 de julho de 1855, aos 16 anos de idade, e sentou praça no Corpo de Imperiais Marinheiros em 5 de agosto do mesmo ano.
Em 1856 embarcou na corveta Constituição e,
logo após, no navio Tocantins. A 15 de maio de 1861 recebeu a sua primeira
promoção, passando a Marinheiro de Terceira Classe. Foi promovido depois a
Marinheiro de Segunda Classe em 11 de maio de 1862. No ano seguinte, já na
Escola de Artilharia, recebeu a classificação de "Praça Distinta".
Em 1864 embarcou na corveta Parnaíba, em
expedição ao Rio da Prata. No regresso, a 20 de julho do mesmo ano, foi
promovido a Marinheiro de Primeira Classe (equivalente hoje a Cabo).
Em 6 de dezembro de 1864, quando o Almirante
Tamandaré iniciou o cerco a Paysandú durante a Campanha Oriental (1864-1865),
Marcilio Dias teve o seu batismo de fogo, contra as forças do Uruguai. Durante
o assalto final à Praça-forte de Paysandú, em 31 de dezembro de 1864, uma
batalha que durou 52 horas, terminando em 2 de janeiro de 1865, Marcílio Dias
foi um dos mais bravos combatentes, tendo ficado famoso o seu grito de 'vitória',
quando subiu à torre da Igreja Matriz de Paysandú acenando para os seus companheiros
com a bandeira do Brasil.
Sagrou-se herói na Batalha Naval do Riachuelo,
em 11 de junho de 1865, no início da Guerra da Tríplice Aliança. Quando a
corveta Parnaíba, onde chefiava o rodízio raiado de ré, foi abordada por três
navios paraguaios, travou uma luta corpo a corpo contra quatro inimigos, armado
de sabre, abatendo dois deles. Na luta teve seu braço decepado na defesa da
bandeira do Brasil.
Para o público externo à Marinha –
intelectuais, artistas, integrantes de movimentos sociais –, João Cândido é o
herói negro número um da corporação. Mas para o círculo militar, Marcílio
Dias, é o herói negro da Batalha do Riachuelo, portanto, quem recebeu inúmeras
homenagens:
- dois meses após a sua morte, a Marinha Imperial
incorporou um navio a vapor, adquirido na Grã-Bretanha para servir para o
transporte de tropas, batizando-o de Marcílio Dias;
- em 1891, um torpedeiro de alto mar, construído em Londres, também foi batizado de Marcílio Dias;
- em 1910, o Almirante Alexandrino de Alencar criou a Medalha Marcílio Dias de Valor Militar";
- em 17 de março de 1919, foi fundado o Clube Náutico Marcilio Dias, na cidade
de Itajaí em Santa Catarina;
- em 1922 foi fundado o Instituto Estadual de Educação
Marcílio Dias, na cidade de Torres/RS;
- em 13 de dezembro de 1926, a Fundação do Amparo ao Marujo Brasileiro, recebeu o nome
de Casa Marcílio Dias, embrião do atual Hospital Naval Marcílio Dias, no bairro Lins de Vasconcelos, no Rio de Janeiro;
- em julho de 1940, o presidente Getúlio Vargas lançou ao mar o contra torpedeiro
Marcilio Dias;
Várias outras instituições, militares ou civis,
em todo o Brasil, assim como ruas, praças, cidades e outros logradouros foram
batizados com seu nome.